segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

Os sentimentos mais fortes na memória têm de ser ditos, repetidos, reiterados, mas dizer o quê? Cada um terá sua lembrança, julgar-lo-á certo ou não estará nem aí. No entanto, é na lembrança que se encontra a raiz do problema: fala-se o que não se sabe e esquece-se o que deveria ser dito. E, continua o vazio, abismos que nos separam em mesas de bar.

- Saideira, por favor. Só mais uma, por favor. Mais uma, vai... Aquela que “sóda” merda, por favor!

Perdi-me na noite e acordei sozinho na cama dela sem entender nada. Nada mais cômodo. O sangue estava por todo lado, mas o que doía mesmo eram os pensamentos sobre o que não sabia; Sobre o que não deveria ter feito. É o fim, e que viva a fantasia. Tudo está por vir, virá! Tudo pela frente, em erro, em dor, modelo padrão pra quem pretende acertar. Talvez um dia numa rua qualquer:

- Oi tudo bem? Que bom revê-lo...
- Que bom revê-la também.

Silêncio absoluto.

- Quanto tempo hein?

Ele com seus botões: "não me diga, quanto tempo", blábláblás...

Ela com os seus: "se não fosse tudo que me desagrada em você, poderíamos ficar juntos", blá-blá-blás...

Encontro é desencontro, sorrisos, tristezas, saudade, perguntas e mais perguntas – tudo vazio. Ele estava errado, para certos sentimentos não há respostas apenas indagações...

quarta-feira, 1 de agosto de 2007

Sugestão de leitura:
O MARIDO DE MINHA MULHER, de Luigi Pirandello
Odisséia Editorial, 192 pgs. R$15,90
Além de renovador do teatro moderno, Luigi Pirandello (186
7-1936) também escreveu romances e contos, nos quais expõe o ridículo das situações cotidianas: "Cada qual se veste com a sua dignidade por fora", escreveu Pirandello, "mas sabe muito bem tudo de inconfessável que se passa no seu íntimo"


Quem dera uma dia você me fale aquilo que nem mesmo pensa, confidências que involuntariamente seu travesseiro ouve e te faz esquecer depois de longas horas de insônia.

sábado, 28 de julho de 2007

Pequenos abismos.
Experiência diária de abismos, o nóir, o érebo! fronteira entre dois mundos, invisível mas que se pode sentir ao cruzá-la. Encontrar-se consigo em meio ao caos da rotina, das máscaras e das fantasias e, contemplando o irreconhecível, admitir: " esse sou eu" e não aquele com nome e sobrenome subordinado a encontrar diferentes formas de passar um tempo que não existe.

quando a solidão me envolve com seu manto, fujo, sempre ao meu encontro, então contemplo-me irreconhecível, distante da realidade, realidade tão abstrata quanto o tédio das noites de domingo em que coloco a prova todos meus objetivos num exercício de auto afirmação. dói!! apenas dói. eis me prostrado ante o abismo de minhas inquietações,triste e sem explicações...

quarta-feira, 18 de julho de 2007

ZOÉ E O BURACO NEGRO.

Frente à xícara de café na mesa da cozinha, Zoé acende um cigarro em nome de tudo que deveria ter feito refeito. Mas esquecido se queima no cinzeiro, enquanto os pensamentos bruxeleaim no compasso da fumaça, tal qual melodia triste a destilar certezas pelo ar. O sol brilha lá fora, mas as janelas estão fechadas, Zoé esta fechado; o telefone não toca, não vai tocar ninguém vai aparecer, nem mesmo uma insolicítada visita. A cinco dias as únicas pessoas com quem ele falou foram entregadores de pizza, e agora, sob a luz fria que ilumina o apartamento ele faz planos para sua noite; vagar entre as interseções de um monologo dramático e as inúmeras possibilidades do acaso, beber cerveja em escala torrencial e conversar com algum estranho ou garçom entediado predisposto a um dialogo cheio de sofismas e interrompido a cada instante pela heróica frase: ‘mais uma por favor" ! assim ele imagina sua noite incluindo o asco e a cara amassada no dia seguinte, acompanhada da leve impressão de que algo esta faltando.
As horas que passaram foram como um rio que deságua em si mesmo, Zoé revivendo tudo em sua memória e plagiando outras vidas, dos momentos felizes as situações patéticas, num misto de imagens que se formavam, deixavam-se fotografar e se desfaziam antes mesmo de serem reveladas. Um vazio em preto e branco e a certeza de que nada aconteceu. A noite chegou triste e granulada de estrelas, aos poucos o silêncio da casa foi se expandindo cidade a fora. Do alto de uma janela que a dias já não se abria, invisível e anônimo ele observa um cachorro no ponto de ônibus do outro lado da rua; ali sentado na calçada, olhar fixo pro horizonte da estrada, aquele animal passa a impressão de estar mesmo esperando uma condução, ele chegou a desejar que estivesse mesmo, para quebrar a mesmice de um mundo que há tempos tornara-se sem surpresas. Foi sorrindo desse devaneio que ele irrompeu cozinha adentro em busca de uma cerveja, a qual constatou ser a ultima. Era preciso sair, ele havia perdido horas de vida potencialmente produtiva imerso em pensamentos e aquele divagar sem rumo pela casa tornara-se patético senão esquizofrênico, além disso, a cerveja e o cigarro acabaram tornando a companhia de si mesmo ainda mais insuportável.
Nasceu?
Não, morreu! Fizeram da vida um sublime aborto e condenaram-no à existência...